Introdução
No artigo anterior “falei” sobre “A Criatividade e a sua relação com a Inovação”, e aqui, dando sequência ao assunto, descrevo algumas etapas que ocorrem no processo criativo pessoal, bem como o uso dos hemisférios esquerdo e direito do nosso cérebro que se destaca em cada etapa. Depois disso, forneço algumas dicas de como podemos levar a vida de forma mais criativa. E ao final comento sobre alguns processos criativos em equipe usados para inovação nas organizações.
O processo criativo individual
O processo criativo é criação e nascimento, e também transformação e renascimento. E a nossa jornada pessoal é um processo criativo guiado por uma dinâmica transformativa.
Quando a pessoa criativa busca algo no fundo de seu ser e disso resulta um produto autêntico, forma-se uma ponte entre pessoas e/ou o indivíduo e o Criador. Os momentos mais significativos e decisivos em nossas vidas exigiram de nós criatividade e assim, podem ser considerados como uma obra de arte, pois em cada uma destas conjunturas somos impelidos para um contexto maior. Mesmo quando tal experiência parece levar-nos de volta a uma realidade menor, acontece com frequência uma expansão interior.
Ao longo dos últimos cem anos, os pesquisadores chegaram a um grau surpreendente de consenso sobre os estágios previsíveis de pensamento criativo. Em geral, no contexto da criatividade individual, reconhece-se a existência de cinco etapas para a criação de alguma coisa: preparação, frustração, incubação, inspiração e elaboração. E ao final devemos complementar estas etapas com a comunicação:
1. Preparação, onde identificamos um problema, um conjunto de desafios. É a etapa da coleta de dados, quando todas as soluções possíveis se espalham diante de nós, de maneira aparentemente desconexa.
2. Frustração e saturação, que geralmente ocorre o resultado da visão de todas essas alternativas. Às vezes o processo criativo é dolorido, incluindo longos períodos de confusão, caos, tensão e, mais que tudo, ambiguidade – que não só pode ser saudável como absolutamente essencial para o processo criativo. Ocorre uma intensa atividade do hemisfério esquerdo do cérebro absorvendo de si mesmo o que é conhecido.
3. Incubação, aqui o problema é encarado com serena atenção, mesmo que o tempo para resolvê-lo seja longo. Deixamos os dados simplesmente flutuarem ao redor da questão principal, de maneira livre e sem estrutura. Deixamos a questão afundar-se nas camadas mais profundas do inconsciente. Vivemos o mistério da questão, confiantes de que, no momento apropriado, o discernimento brotará. E isso pode levar horas, dias, semanas ou até mesmo meses. Esta atividade normalmente começa quando nos afastamos de um problema, porque o nosso hemisfério esquerdo do cérebro parece não conseguir resolvê-lo. Um exercício físico intenso pode ser uma ótima maneira de mudar para hemisfério direito, a fim de acessar novas idéias e soluções. Um escritor, depois de escrever por cerca de 90 minutos, por exemplo, pode parar e caminhar ou correr, algo que é muito útil ao cérebro.
4. Inspiração ou iluminação, vem quando surge a resposta tão esperada, Heureca! Ah! Ah! O mistério dá lugar ao discernimento. A pintura produz efeitos! . Onde você está quando surgem suas melhores ideias? Suponho que não é quando você está sentado em sua mesa, conscientemente tentando pensar criativamente. Pelo contrário, é quando você deu ao seu hemisfério esquerdo do cérebro um descanso, e geralmente está fazendo outra coisa, se exercitando, tomando banho, dirigindo ou até mesmo dormindo.
5. Elaboração, que consiste de muita transpiração envolve o hemisfério esquerdo do cérebro, com modo de pensar analítico. Aqui está o trabalho árduo do fazer acontecer. Esta etapa é de desafio e teste do avanço criativo que você teve. Cientistas fazem isso em um laboratório. Pintores fazem em uma tela. Escritores fazem, traduzindo uma visão em palavras.
A comunicação complementa o processo criativo acima. O poema que não é lido pela pessoa amada fica incompleto. A pintura vista apenas pelo artista ou a canção ouvida apenas pelo cantor são obras de arte incompletas.
Uma forma de nutrir intencionalmente a nossa criatividade é entender como ela funciona, aprendendo a envolver o cérebro inteiro, alternando intencionalmente as atividades do hemisfério direito e esquerdo do cérebro com esforço e descanso, e deixar fluir. Muitas vezes os estágios de criação se desdobram em sequência imprevisível, e um envolve o outro. Ainda assim, mantê-los em mente nos permite saber onde estamos no processo criativo e como chegar aonde precisamos/queremos.
Devemos lembrar que os introvertidos se sentem confortáveis trabalhando sozinhos e que muitas vezes a solidão é um catalisador para a inovação. Muito inventores e engenheiros são como Steve Wozniak, da Apple, que escreveu o livro iWoz, onde comenta que eles são como artistas, tímidos e que vivem em suas cabeças. E em geral os artistas trabalham melhor sozinhos, preferencialmente fora dos ambientes corporativos, onde podem controlar o projeto de uma invenção sem outras pessoas interferindo.
O equilíbrio com a combinação de uso dos dois hemisférios do cérebro produz excelentes resultados, que podem ser medidos de forma objetiva em áreas como aprendizado e criatividade, motivação e autodisciplina.
Como podemos levar uma vida criativa?
“A criatividade é simplesmente conectar coisas.” – Steve Jobs
Veja a seguir algumas dicas que podem ajudar a desenvolver o pensamento criativo pessoal:
- Aceite a si mesmo e procure se conhecer melhor.
- Cultive a mentalidade de principiante. Aprenda sempre, em especial no campo no qual se sinta mais competente.
- Seja um observador perspicaz. Procure semelhanças, diferenças e características peculiares em tudo o que cruzar o seu caminho. Ao fazer isso, exercitará ambos os lados do cérebro, o racional e o intuitivo. Também aceirará sua responsabilidade para ser tudo o que puder ser, ficando o mais alerta possível tanto à sua sabedoria interior quanto ao seu ambiente. Tente muitas combinações diferentes de associação e relacionamento.
- Seja curioso, não pare de questionar as coisas, faça muitas perguntas.
- Aonde quer que vá, leve um caderno. Anote nele seus pressentimentos, pensamentos estranhos, perguntas “tolas” e inspirações, antes que sumam da mente.
- Desenvolva uma disciplina de criatividade meditativa. Fazer coisas com as mãos desenvolve o amor próprio e, fazendo-as com compreensão, aumenta o autoconhecimento e a compaixão, além da criatividade.
- Encontre meios de ensinar aos outros o que você sabe ou está aprendendo. Ensinar é o melhor meio de aprender.
- Ria. O humor alivia a tensão, ajuda a colocar os problemas em perspectiva e prepara o terreno para a atitude alegre, na qual a criatividade começa a fluir.
- Leia muitos assuntos diferentes de seu campo de interesse e procure relacionar o que aprendeu com o que já sabe.
- Seja valente. O medo é o maior empecilho à criatividade, contudo inerente ao novo desconhecido. Combata seu medo, mas repeite-o.
- Evite padrões estabelecidos com severidade e maneiras inflexíveis de agir. Esteja disposto a experimentar coisas novas, correr riscos e fracassar. Seja flexível o bastante para abandonar uma idéia em favor de outra.
- Aprenda a viver com ambiguidade. Ambos os avanços, criativo e espiritual, nascem desse desconforto.
- Busque o que é simples e óbvio. Enxergar soluções simples que ninguém vê também é importante.
“O óbvio é aquilo que nunca é visto até que alguém o manifeste com simplicidade.” – Kahlil Gibran
À medida que você crescer neste caminho você ficará mais flexível, mais capaz de passar do método analítico para o poético, e de novo para o analítico.
O processo criativo em equipe
“Pensar com um designer pode transformar a forma como você desenvolve produtos, serviços, processos – e mesmo estratégia.” – Tim Brown
Cada vez mais as empresas reconhecem o valor do trabalho em equipe, da colaboração e da necessidade e a importância de se compartilhar o conhecimento.
A criatividade coletiva, surge geralmente da interação de um grupo com o seu exterior ou de interações dentro do próprio grupo e tem como objetivo principal otimizar ou criar de forma mais rápida produtos, serviços, processos e modelos de negócio.
Recentemente escrevi um artigo que descreve resumidamente, como um pequeno guia, a metodologia Design Thinking – uma abordagem para inovação centrada no ser humano que inclui pessoas, protótipos, histórias e cultura. No artigo apresento o processo que é utilizado para auxiliar na busca por Inovação nas organizações, onde são descritos os passos: Descoberta, Interpretação, Ideação, Experimentação e Evolução, que incluem técnicas de brainstorming e prototipação.
“O design thinking é uma abordagem para enfrentar problemas baseada em três pilares: empatia, colaboração e experimentação.” – Tennyson Pinheiro
Usar o Design Thinking é buscar observar o mundo sob o ponto de vista dos outros, ou seja, empregando-se a empatia. Esta metodologia incentiva a criatividade pessoal e a coletiva, a experimentação intelectual e prática e a colaboração interdisciplinar.
Na geração de idéias, por exemplo, são considerados três critérios sobrepostos:
- Praticabilidade (técnica) – o que é funcionalmente possível num futuro próximo;
- Viabilidade (econômica / financeira) – o que provavelmente se tornará parte de um modelo de negócio sustentável; e
- Desejabilidade – o que faz sentido para as pessoas.
Leia o artigo: Usando o Design Thinking para Criar e Inovar nos Negócios para mais informações sobre esta metodologia.
Existem outros processos propostos para trabalhar inovação, entre eles temos o do livro “A Bíblia da Inovação” de Fernando Trías de Bes e Philip Kotler para grandes organizações – que apresenta como etapas do processo: Objetivos > Pesquisa > Idéias > Avaliação > Desenvolvimento > Lançamento. Este processo usa o modelo A-F com uma lista de funções básicas que devem ser atribuídas a indivíduos específicos, que a partir de objetivos, recursos e prazos devem interagir livremente para criar os próprios processos. Os autores dizem que o processo de inovação não é algo linear, mas algo que avança, porém com muitos recuos e desvios. Resumindo as funções (A-F) dos colaboradores neste processo temos:
- Ativadores – pessoas que iniciam o processo de inovação;
- Buscadores – são os especialistas em encontrar informações;
- Criadores – são os que produzem idéias, concebendo novos conceitos e possibilidades e buscando por soluções;
- Desenvolvedores – são os inventores, que transformam idéias em produtos e serviços;
- Executores – cuidam de tudo relacionado com implementação e execução – são eles que levam a invenção ao mercado;
- Facilitadores – são os que aprovam os novos itens de despesa e o investimento necessário, a medida que o processo de inovação avança.
Todos trabalhando juntos e interagindo uns com os outros.
Os autores propõe três fases para facilitar a criatividade:
1) Escolha do Foco – algo em particular para se concentrar. Pode até ser algo concreto e bem definido, como um problema, objetivo ou coisas físicas. Por exemplo: Aumentar a motivação da equipe de vendas; Melhorar a forma com que os produtos são embalados; Atrair novos clientes; Aumentar a presença no mercado de consumidores com mais de 60 anos; Melhorar a qualidade de serviços sem aumentar os custos; Ter tampa e rótulo novos e mais modernos; aprimorar o sistema de freio hidráulico.
2) Deslocamento – provocar ou perturbar a lógica. Propor uma “impossibilidade”, um paradoxo, com o intuito deliberado de estimular novas conexões. Utilizar pensamento lateral e outras técnicas. Alex Osborn concluiu que a maioria das técnicas e jogos criativos se baseiam em sete operações, das quais seis os autores deram o acrônimo de SECRET, a saber: Substitir partes do foco; Eliminar partes do foco; Combinar elementos do foco com alguns outros; Reorganizar os elementos do foco; Exagerar aspectos ou qualidades do foco; e Transpor elementos do foco.
3) Conexão – que significa considerar o deslocamento ou paradoxo e tentar decifrá-lo, encontrar uma explicação.
Concluindo
Quando vejo uma obra de arte que me impressiona, admiro o artista que a criou. Quando vejo a beleza da natureza fico encantado. Quando olho para uma flor, tão simples e tão bela, procuro apenas apreciá-la, mas bem sei que ela é extremamente complexa, e que, cada um com seu próprio conhecimento e experiência pode vê-la com perspectivas muito diferentes. Imagine como um poeta vê e descreve uma flor, e como seria o olhar e descrição da flor por alguém que pinta, fotografa, vende ou ainda é especialista em biologia, física ou química. Agora imagine algo que ainda não existe, é possível? E ai, que tal exercitar a imaginação para criar, seja só ou em equipe.
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