ESG, Tendência ou mais do mesmo?

“Meu objetivo principal aqui é muni-los de informação e não apenas opinião a respeito do tema. A conclusão cabe a você.”

Ultimamente temos ouvido e lido nas midias sociais muita opinião sobre ESG, inclusive com severas criticas negativas e pouco apoio construtivo para esta agenda e caminho comportamental das organizações e demais instituições.

Assim, resolvi compartilhar alguns pontos sobre o tema a partir de anotações de uma palestra que ministrei no início do ano passado. O texto está bem resumido, porém acredito que passará a essência das informações sobre o tema.

Introdução

Não sou defensor de ideias ou modismos, mas sim de práticas de valor que gerem transformação na direção de um planeta e uma a sociedade melhor para todos.

Assim, procuro incentivar quaisquer movimentos que busquem tais melhorias, seja nos conceitos da Nova Economia que engloba a economia Compartilhada, economia Colaborativa, economia Multivalores, economia Circular, economia Digital, …, movimentos como os de um Capitalismo Consciente, Empresas B, Sustentabilidade e agora ESG.

Não devemos esperar algo perfeito como num projeto com início e fim, mas como em um processo de melhoria contínua para todos. ESG é apenas parte disso tudo, principalmente pelos princípios e valores que devem ser seguidos pelas organizações que os praticam.

Existem critérios sérios para que uma empresa atinja um bom nível de qualificação na B3 assim como em outras bolsas mundiais, que demonstram a qualidade com que tratam dos valores ambientais, sociais e de governança na prática. Além disso há demonstrações de que elas acabam ao final gerando melhores resultados financeiros. É isso que atrai investidores aos fundos ESG e a negociação de ações.

Não é modismo, ESG existe há 18 anos, só no Brasil que é novidade, pela adoção recente (2019) em bolsa de valores.

Não se trata de apenas um nome, mas sim de uma nova visão e forma de tratar os intangíveis da sustentabilidade (social e ambiental) com governança apropriada (algo qualitativo via indicadores), o que é diferencial da visão anterior que incluía a sustentabilidade financeira que é tangível e que a contabilidade trata de forma quantitativa (com números).

Sim, sempre existiram os espertalhões especuladores, mas isso não descaracteriza o valor ESG.

ESG não é mais do mesmo, pois é uma evolução que atingirá todas as empresas.

Começarei falando das MEGATENDÊNCIAS que conduzem as tendências tecnológicas, econômicas e sociais, e que por consequência afetam mercados financeiros.

A evolução humana, num mundo capitalista está diretamente ligada aos negócios que afetam a economia e a qualidade de vida.

ESG trata de vida, ambiental e social, governada com princípios e valores humanos.

Pelo menos as empresas de valor, estão tentando fazer o seu papel numa sociedade que vive o caos da complexa e aceleração, e injustiças consequentes pela má governança e gestão. Hoje falam do agronegócio, que no Brasil é de latifúndios voltados à exportação para sustentar o mundo, enquanto ainda temos tantos passando fome aqui mesmo. Precisamos fazer alguma coisa e movimentos como dos das Empresas B, Capitalismo Consciente e ESG trazem princípios e valores, que se respeitados e bem trabalhados podem fazer toda a diferença.

Megatendências e o Contexto Atual

Megatendências vêm mudando a forma como vivemos há séculos. São forças poderosas e transformadoras que podem mudar a economia, os negócios e a sociedade global.

Pense em eletricidade, automóvel, Internet.

1. Mudanças climáticas e escassez de recursos

Quebra de safra, inundações generalizadas, habitats destruídos e escassez de energia
Se as previsões estiverem corretas, em 2100 a temperatura média da superfície do planeta terá aumentado em 5.8 C desde o final do século 19, e os recursos do planeta se tornarão cada vez mais escassos. Fonte: ipcc.ch

2. Demografia e mudança social

Escassez de mão de obra, demanda por saúde e mudanças nas demandas dos consumidores
A população global pode aumentar em mais de 1 Bilhão em 2030 e em 2050, um terço da população de 55 países terá mais de 60 anos. Fonte: un.org

3. Avanço Tecnológico

As máquinas aprenderão mais rápido do que os humanos e os dados pessoais serão uma mercadoria valiosa
Quase dois terços de todas as ocupações (60%) poderão ver um terço ou mais de suas atividades constituintes automatizadas. Fonte: mckinsey.com

4. Urbanização Rápida

Espaço e acomodação se tornarão mais um problema nas grandes cidades.
Dois terços da população mundial viverão em áreas urbanas em 2050 (66%).
Em 1950, apenas 30% viviam em áreas urbanas.
Fonte: Hing, E, Hsiao, C. Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA.

5. Mudança de poder econômico

A China se tornará a nova superpotência, a população da Ásia está crescendo rapidamente, mudando a demografia global
A China pode se tornar a nova superpotência mundial em 2030 e junto com a Índia rivalizando com os EUA em 2050. Fonte: FMI para estimativas de 2016, análise PWC para projetos até 2050.

ESG – Environmental, Social & corporate Governance

ESG - Environment, Social, Governance

ESG – Acrônimo em inglês para Environmental, Social e corporate Governance, ou seja, amplamente utilizado no mundo dos investimentos para se referir a aspectos não financeiros da gestão empresarial

As 5 principais organizações que são líderes no desenvolvimento e padronização de frameworks e standards relacionados aos aspectos ESG — CDP, CDSB, GRI, IIRC e SASB — uniram forças.

O ESG ganhou muita força nos últimos anos e tem origem em dois movimentos separados, que se convergem cada vez mais.

O primeiro é o accountability. Cada vez mais, as pessoas estão interessadas em conhecer o impacto que as empresas têm sobre seus colaboradores, clientes, suas comunidades e sobre o meio ambiente. Portanto, continuamente tentamos quantificar estas estruturas em métricas, as quais agora possuem novas categorias como o social, o ambiental e os aspectos da governança.

De outro lado, temos o movimento do business valuation com o argumento de que as métricas que o mercado tem hoje não conseguem capturar todo o desempenho e valor da empresa, pois não conseguem capturar aspectos intangíveis, tais como capital intelectual, social e humano do negócio. As métricas de ESG podem indicar como mensurar este capital.

Origem do termo ESG

  • Há pelo menos 50 anos, já existia a preocupação com investimento em negócios sustentáveis.
  • Na metade da década de 1970, surgiu a sigla SRI, que, em uma tradução para o português, quer dizer investimento sustentável responsável.
  • A partir dessa época, fatores sociais passaram a contar cada vez mais na hora de escolher qual corporação merecia receber aporte financeiro de investidores.
  • Empresas que apoiavam a política do apartheid na África do Sul ou financiavam a Guerra do Vietnã, por exemplo, passaram a ter seus pedidos de investimento negados em razão das causas que defendiam.
  • Aos poucos, essas preocupações foram se expandindo, focando também nos impactos ambientais, entre outros critérios de responsabilidade corporativa das organizações.
  • A sigla ESG, no entanto, só foi aparecer de fato no presente século, mais precisamente em 2005, com o relatório “Who cares wins” (“Ganha quem se importa”), redigido pela Organização das Nações Unidas (ONU).
  • A iniciativa reuniu 20 instituições financeiras de diferentes países, inclusive o Brasil, para definir diretrizes a respeito da inclusão de temas ambientais, sociais e de governança no gerenciamento de fundos e pesquisas com relação a esses assuntos.
  • Decidiu-se então que a inclusão dessas avaliações no mercado financeiro era benéfica não apenas para as empresas e os investidores, mas também para a sociedade como um todo.

Fonte: FIA

Alguns Números

Segundo relatório da PwC, até 2025, 57% dos ativos de fundos mútuos na Europa estarão em fundos que consideram os critérios ESG, o que representa US$ 8,9 trilhões, em relação a 15,1% no fim do ano anterior. Além disso, 77% dos investidores institucionais pesquisados pela PwC disseram que planejam parar de comprar produtos não ESG nos próximos dois anos. [uma forma consciente de investir]

No Brasil, fundos ESG captaram R$ 2,5 bilhões em 2020. Este levantamento foi feito pela Morningstar e pela Capital Reset. Levantamento anual feito pela Deloitte e pelo Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (IBRI), em 2021, mostrou que 74% das empresas com ações em Bolsa planejam aumentar o orçamento destinado a ESG em 2022.

ESG na B3

Como parte de sua estratégia de ampliação do portfólio de índices ESG, a B3 lançou, em setembro de 2020, em parceria com a S&P Dow Jones, índice S&P/B3 Brasil ESG, que utiliza critérios baseados em práticas ambientais, sociais e de governança para selecionar empresas brasileiras para sua carteira. Entre os critérios está a aderência aos Dez Princípios do Pacto Global na área de Direitos Humanos, Trabalho, Meio Ambiente e Anticorrupção. Neste sentido, além dos Dez Princípios do Pacto Global, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável servem de guias para que as empresas analisem se suas práticas ESG estão alinhadas aos padrões internacionais e referência.

ESG na Blackrock

A maior gestora da ativos do mundo, a BlackRock, com mais de US$ 6 trilhões em carteira, passou a incluir em 2020 métricas ESG, transversalmente, em todas as suas análises de riscos.

Conheça os princípios do Pacto Global

Direitos humanos

1. empresas devem apoiar e respeitar a proteção de direitos humanos reconhecidos internacionalmente.

2. Assegurar-se de sua não participação em violações destes direitos.

Trabalho

3. As empresas devem apoiar a liberdade de associação e o reconhecimento efetivo do direito à negociação coletiva.

4. A eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou compulsório.

5. A abolição efetiva do trabalho infantil.

6. Eliminar a discriminação no emprego.

Meio ambiente

7. As empresas devem apoiar uma abordagem preventiva aos desafios ambientais.

8. Desenvolver iniciativas para promover maior responsabilidade ambiental.

9. Incentivar o desenvolvimento e difusão de tecnologias ambientalmente amigáveis.

Anticorrupção

10. As empresas devem combater a corrupção em todas as suas formas, inclusive extorsão e propina.

Indicadores do Guia para Empresas Listadas na B3

Clique nas imagens abaixo para pode-las visualizá-las melhor.

Indicadores Ambientais

Indicadores Sociais

Indicadores de Governança Corporativa

Considerações finais

Ultimamente temos ouvido muito falar em empresas que fazem o que chamamos de Greenwashing, ou seja, maquiagem marketeira para se mostrar ao mercado e aos clientes como sendo uma empresa exemplar, por cuidar dos interessados (stakeholders) na atuação de sua companhia e não só dos investidores (shareholders), preocupando-se e atuando nos aspectos ambientais, sociais, de governança corporativa, etc. Mas nem todas são assim, temos muitas empresas sérias e como vimos a própria B3 usa de critérios via indicadores para avaliar as empresas listadas como ESG em seu portfolio.

Queremos sim, que além de grandes empresas, empresas médias e pequenas utilizem critérios e indicadores ESG e sejam orientadas pelos objetivos de desenvolvimento sustentável. Chega de Greenwhashing, chega de maquiagem.

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Abraços, @neigrando

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Escolhendo os sócios ao empreender

Na jornada de empreender é preciso: um motivo (propósito); uma razão (por que?); uma paixão (ideia); um desejo/vontade (querer fazer); um comportamento (escolha de valores); um jeito próprio de ser (estilo); escolher um caminho (estratégia); escolher os companheiros (sócios e equipe); estabelecer os marcos; tentar prever os obstáculos (dificuldades, riscos); obter os recursos necessários; planejar; saber como executar (desenvolver, produzir, divulgar, vender, entregar); e muito mais.

Segundo  Joseph Schumpeter[1], o empreendedor precisa ser alguém versátil, que possui as habilidades técnicas para saber produzir, e capitalista, que consegue reunir recursos financeiros, organizar as operações internas e realizar as vendas da sua empresa.

Empreender também requer fazer escolhas, como por exemplo: iniciar individualmente (só) ou coletivamente (com sócios)? Atuar como serviços, comércio ou indústria? Ter um negócio próprio ou uma franquia? Atender empresas (B2B) ou usuários finais (B2C); Utilizar um canal de vendas físico ou virtual?

Tendo em vista os desafios e as habilidades necessárias para construir e gerir um negócio, decidir fazê-lo com um ou mais sócios é uma opção atraente. Mas como escolhê-los? E como alinhar as expectativas de cada um, manter bom relacionamento e evitar conflitos?    

            É disso que trata este artigo, questões societárias básicas.

Compartilhando o peso de empreender

Quando se pensa em ter um sócio para dividir o lucro do negócio, a primeiro ponto a se levar em conta é por que ter um sócio? Ou, ainda melhor, para que é que eu preciso ter um sócio?

Percebe-se um ambiente de negócios cada vez mais imprevisível, dinâmico, ininterrupto e acelerado. Empreender nesse ambiente não é uma tarefa fácil, pois conforme BENNETT e LEMOINE (2014) agora a gestão inclui volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade,  exigindo mais flexibilidade e agilidade aos decisores das empresas.

Em maio de 2011, ocorreu na FIAP, em São Paulo, um evento de tecnologia chamado GoaP – Geeks on a Plane, e nele, um dos palestrantes, investidor da região de Silicon Valley dos EUA, disse que a maioria das startups que obteve sucesso por lá, tinha dois ou mais sócios e destacou que carregar todo o peso de uma empresa sozinho não é uma tarefa fácil.

O relatório Startup Genome[2] aponta que fundadores solitários de empresas levam 3,6 vezes o mais tempo para atingir o estágio de crescimento em escala da startup do que as empresas com dois sócios.  Ou seja, sociedades com dois parceiros de negócios em sintonia geram sinergia, “1 + 1 é mais que 2”.

Mesmo sem ter as estatísticas do Brasil nesta área, pode-se imaginar cenários semelhantes nos quais fica mais fácil se conduzir uma empresa compartilhando as responsabilidades do negócio com um bom parceiro, alguém ético, que tenha paixão pelo que faz, muita vontade de trabalhar, e com competências complementares às do cofundador, suportando as pressões do dia-a-dia e transmitindo energia positiva para incentivar as pessoas a sua volta.

Vale lembrar que, por diversas razões, o risco de continuidade em uma empresa dependente de apenas um sócio é maior, podendo inclusive dificultar o acesso a recursos financeiros de investidores.

Sócio é um recurso muito caro

TRIAS DE BES (2008), aponta o sócio como o mais caro dos recursos de uma empresa, pois é com ele que o lucro será dividido. Um sócio é um recurso a mais, porém, às vezes, é possível encontrar outras formas de substituí-lo sem precisar fornecer participação na sociedade.

Um dos motivos que pode levar o empreendedor a se associar é o medo. O medo de empreender, de correr riscos, errar ou de não dar conta do que precisa ser feito; o medo de estar só e, às vezes, até mesmo o medo de tomar decisões. Para empreender sozinho, é necessário ser capaz de suportar as pressões do dia a dia, principalmente as que são causadas por eventos inesperados. Esses eventos podem ser internos, como um colaborador chave pedir demissão de uma hora para outra, ou podem ser externos, como um fornecedor que não entregou a mercadoria no prazo, o aumento repentino de custo de insumos, um novo concorrente que surgiu ou até mesmo alguma mudança radical na economia. É preciso saber tomar decisões, e rápido, mas não apressadamente. (TRIAS DE BES,2008).

Empreender requer uma visão particular das coisas, uma mistura de intuição e visão de negócio, difícil de compartilhar e alinhar com a visão de outras pessoas. Decidir sozinho permite decidir rápido, e isto é uma vantagem.

Em sociedade, algumas decisões requerem a aprovação de todos ou pelo menos da maioria, e isto pode levar algum tempo. Nesse sentido, para as coisas acontecerem rápido, alguém deve ser designado como responsável pelas decisões finais, com poder e autoridade de comando, direção e ordem.

Algumas perguntas para reflexão:

  • É realmente necessário um sócio e dividir parte do capital?
  • O que esse sócio pode fazer pelo negócio que eu não posso?
  • A escolha desse parceiro de negócios está sendo feita pela razão certa? Qual a motivação?
  • Que capital (R$) e quais outros recursos físicos e intangíveis o sócio trará para o negócio? O quanto de valor realmente será acrescentado ao negócio?
  • Os objetivos de curto, médio e longo prazos estão em sintonia?
  • Existem outras maneiras para preencher a falta de conhecimento ou capacidades sem que eu precise ter um sócio?

Alguns recursos que podem substituir a necessidade de um sócio:

  • Se precisar apenas de dinheiro, procure uma linha de crédito, um fundo de capital de risco, um investidor ou um banco.
  • Se precisar de ajuda, contrate um profissional.  Preferencialmente alguém que seja especialista na função ou atividade escolhida: gestor administrativo, gestor financeiro, gestor de vendas, ou outro.
  • Se precisar de alguém para fazer uma parte do negócio, a qual não domina e não faça parte do núcleo do negócio, terceirize para quem tem competência.
  • Se quiser companhia, para não tomar decisões precipitadas, converse com outros empreendedores; participe de feiras e eventos, fóruns de negócio etc.
  • Se precisar de conselhos técnicos, contrate um consultor;
  • Se precisar de conselhos legais, contrate um advogado.

Observações:

  • Se decidir contratar alguém ou terceirizar procure fazer isto com cautela, seja criterioso na seleção dos candidatos e só faça isso no momento que realmente estiver precisando da pessoa ou empresa, preferencialmente depois de ter bons clientes pagantes, ou seja, fluxo de caixa positivo.

Características do Sócio Ideal

Um bom sócio, mais do que um recurso, é alguém integro, de bom caráter, com perfil complementar de personalidade e de competências, que tem muita vontade de trabalhar, sintonizado com os demais sócios e com os objetivos do negócio e que realmente agregue valor à sociedade. É preciso que tal parceiro de negócios tenha paixão, coragem, preparo e determinação para empreender.  Não pode ser apenas alguém legal que parece levar jeito para a coisa. Vale lembrar que a escolha desse novo cotista é bilateral ou multilateral, ou seja, tanto a empresa quanto o candidato estarão decidindo. Para isso, é importante conhecer melhor a si mesmo e o outro, o que pode levar algum tempo. (GERBER, 2012; WELCH, 2005).

WELCH (2005), ao discorrer sobre liderança, apresenta um método que utilizou na General Electric. Nele, apresenta algumas características essenciais a um líder:

  • Integridade (sinceridade) – pois diz a verdade, cumpre as promessas, assume responsabilidades por suas ações passadas, reconhece seus erros e os conserta, conhece as leis do país e as regras da empresa e as cumpre, joga para ganhar de maneira honesta seguindo as regras.
  • Inteligência – pois têm curiosidade intelectual, conhecimentos e capacidade para trabalhar com outras pessoas.
  • Maturidade – pois enfrenta bem as situações de sufoco, sabe lidar com o estresse e retrocessos, nos momentos maravilhosos curte o sucesso, respeita as emoções alheias, é confiante, mas não é arrogante, tem senso de humor, principalmente a respeito de si mesmo.

Se o candidato passou por estas características essenciais, WELCH (2005) então continua em frente, recomendando verificar os 4Es e 1P a saber:

  • Energia positiva – pois avança, prospera na ação e curte a mudança, é geralmente extrovertido e otimista, conversa com naturalidade e faz amizade com facilidade, começa o dia com entusiasmo e geralmente o termina da mesma maneira, raramente parece cansado durante a jornada, não se queixa do excesso de trabalho, gosta de trabalhar mas também gosta de se divertir e ama a vida.
  • Energização – tem a capacidade de energizar os outros, inspirar a equipe a aceitar desafios e/ou o impossível e vibrar com a missão, deve conhecer profundamente o negócio e ter forte capacidade de persuasão.
  • Estofo – ou seja, a coragem de tomar decisões difíceis do tipo sim ou não, sabe quando partir para a ação, mesmo com poucas informações arrisca e usa a intuição.
  • Execução – faz o que é preciso fazer (o trabalho), converte decisões em ações e persiste até a conclusão, supera as resistências, vence o caos e transpõe os obstáculos inesperados, sabe vencer e conseguir resultados.
  • Paixão – tem uma vibração sincera, profunda e genuína em relação ao trabalho, importa-se de verdade com a vitória dos colegas, colaboradores e amigos; ama aprender a crescer e é estimulado/a quando outras pessoas ao redor também aprendem e crescem; não vibra apenas com o trabalho, demonstra paixão por tudo, pois tem a seiva da vida nas veias.

Esses podem parecer adjetivos de super-herói, mas são um ideal a buscar. É raro encontrar um profissional para gestão ou um pretendente a sócio com todas essas qualidades, mas essa lista, pelo menos, serve como guia comparativa, nos ajudando a avaliar as características do possível sócio. Podem também servir para uma avaliação pessoal de qualidades e defeitos, como instrumento de autorreflexão.

Ao longo do convívio e/ou durante uma boa conversa com perguntas apropriadas é possível identificar os comportamentos típicos da pessoa, seus hábitos, seus pontos fortes e seus pontos fracos. Afinal, o objetivo é encontrar alguém competente, leal, ético/a, de confiança e comprometido/a.

Perfis de sócios a serem evitados

Segundo GERBER (2012) Ao analisar um potencial sócio deve-se considerar alguns perfis que, quando são exagerados devem ser evitados:

  • O dono da ideia – a ideia do negócio é importante e tem valor, mas sem a devida execução, esse valor fica próximo de zero. Se o provável sócio é apenas a pessoa que trouxe a ideia do negócio, isso não basta. Para fazê-la tornar-se realidade, é preciso investimento e muito trabalho. O dono da ideia terá de participar de tudo, precisará fazer sua parte.
  • O perfeccionista – perfeccionismo[3] é um defeito e não uma virtude. Muitas vezes, a busca da perfeição em um plano ou uma tomada de decisão pode mascarar uma procrastinação ou o medo de fazer acontecer. O profissional deve buscar a excelência e mitigar riscos, mas deve também ter equilíbrio e iniciativa.
  • O acadêmico – a base acadêmica pode ser muito útil ao negócio, um doutor pesquisador pode ter muito a contribuir, mas é bom certificar-se de que o potencial sócio saiba distinguir a teoria da realidade. Na prática nem tudo acontece como ensinam os livros, sendo necessário considerar a realidade do mercado entre outros fatores.
  • O dono da razão – algumas pessoas pensam que estão sempre certas, são influenciadoras e até mesmo manipuladoras. Têm dificuldade de ouvir e aceitar as ideias e opiniões de outras pessoas. Muitas vezes são verdadeiros ditadores que odeiam ser contrariados. Vale lembrar que a empatia, a colaboração e a boa comunicação são essenciais em uma sociedade.
  • O folgado – a vida pessoal é importante, mas a fase inicial de uma empresa vai exigir sacrifícios. Muitos dizem que haverá alegria, mas que exigirá dos sócios: “sangue, suor e lágrimas”, ou seja, muito trabalho. Algumas pessoas tendem a não dedicar o mesmo tempo ao trabalho do que outras. Elas sempre têm algo pessoal urgente e/ou importante a fazer, estão sempre precisando de uns dias de folga e dificilmente repõem o tempo usado com horas de trabalho adicional em outros dias. É preciso cuidado para não trazer para o negócio alguém que nunca aparece. Antes de escolher um sócio, verifique se o estágio atual de vida dele ou dela é compatível com o seu, exemplo: solteiro/a versus casado/a com filhos pequenos.
  • O gastão – uma empresa iniciante geralmente não tem muitos recursos financeiros. Um sócio “boa vida”, que não tem responsabilidade com o gasto do dinheiro da empresa ou que mistura despesas pessoais com as da sociedade pode destruir o negócio em pouco tempo. O ideal é alguém que valorize cada centavo ganho ou a ser investido no negócio. É fundamental estabelecer claramente de que forma o dinheiro da empresa será usado.

Além desses perfis exagerados, existe um outro tipo de sócio que deve ser considerado com cuidado: o parente. Muitas empresas familiares dão certo, a confiança costuma ser o principal motivo para esse tipo de sociedade, mas vale lembrar que ter o marido ou a esposa como sócios pode prejudicar o relacionamento do casal. Ter o irmão ou irmã como sócios pode ser muito interessante a princípio, mas imagine se não der muito certo trabalhar juntos, como administrar os conflitos? Como seria a separação? Uma coisa é despedir um funcionário, outra é terminar a sociedade com um ex-amigo, por exemplo, já a pior situação de todas é ter que pedir um rompimento societário com um parente e depois ter que encontrá-lo no círculo familiar.

Uma conversa franca

Antes de escolher o sócio ou a sócia é bom ter uma conversa a dois de portas fechadas, e, então dialogar sobre: visão política, religiosa, time que torcem, maus hábitos e estilo de trabalho; dívidas e/ou obrigações financeiras que cada um tem; informações que seriam reveladas ao checar antecedentes de crédito; se há alguma disputa jurídica pessoal ou corporativa em aberto ou do passado, ou potenciais problemas que podem surgir a qualquer momento; obrigações pessoais, empresariais ou de estudo que podem afastá-lo/a das atividades na empresa; desejos de participação de capital e trabalho na sociedade, bem como outros pontos a serem considerados em um acordo formal; informações sobre cônjuge, pais, irmãos e filhos; visão para o negócio e outros pontos que achar relevante para ajudar na tomada de decisão de se associar ou não. Lembre-se de que a confiança mútua será fundamental na caminhada. (GERBER, 2012).

O que deve ser combinado entre os sócios

Ao escolher um ou mais sócios para o empreendimento, algumas coisas precisam ser combinadas e ficar muito claras. Advogados e investidores, recomendam ter tudo documentado num acordo de cotistas[4], um documento que complementa o contrato social[5] exigido por lei. Quando se coloca o que foi combinado num documento, fica difícil alguém falar depois em uma conversa: “eu não disse isso” ou “não foi bem isso que eu quis dizer”. Antes mesmo da sua função legal, esse documento tem o papel de lembrar os envolvidos sobre aquilo que foi combinado e, por isso, deve ser muito bem redigido, lido, e conferido antes de ser assinado pelas partes. Isso separa o relacionamento de amizade do profissional e evitará, ou pelo menos diminuirá, muito os conflitos, discussões e até mesmo as brigas no futuro.  O apoio e as orientações de um advogado experiente são recomendados neste caso, e é claro que o acordo poderá ser alterado no futuro com o consentimento de todos.

O que deve conter o acordo de cotista

O mais importante é saber qual será o papel de cada um na sociedade. Não só o cargo, mas também as funções, ou seja, qual “chapéu” ou quais os “chapéus” que usarão. Quais serão suas responsabilidades e qual será a remuneração por esse trabalho. É importante separar bem a participação no lucro da empresa, que está relacionada com as cotas da sociedade, da remuneração pelas atividades. 

Outro item fundamental é com relação à saída de um dos sócios, a conhecida cláusula de exit. É importante combinar desde o início da sociedade como será a separação, ou seja, o que será feito se um dos sócios quiser deixar a empresa, ou, ainda mais grave, se um dos sócios quiser que o outro deixe a empresa.

Além de estipular o capital inicial, deve ser combinado em que situações poderão ser feitos aportes adicionais de dinheiro e como serão os procedimentos.

O documento deve indicar quem autoriza pagamentos e assina os cheques.

Cuidados adicionais devem ser tomados com relação a sócios investidores, que só entram com o capital no negócio.

Observação:

As sociedades de responsabilidade limitada correspondem a mais de 90% das sociedades (empresas com mais de um sócio) legalmente formalizadas no Brasil. Uma sociedade assim visa à proteção do patrimônio pessoal dos sócios, ou seja, se a sociedade não der certo ou tiver um insucesso comercial, os sócios responderão no limite do capital social pré-estabelecido em contrato. E, assim estará preservado o patrimônio pessoal de cada um dos sócios. No entanto, é preciso tomar cuidado para ter impostos e taxas pagos em dia e estar atento para não misturar dinheiro pessoal com o da pessoa jurídica. Se houver um insucesso e for constatada uma confusão patrimonial ou sonegação fiscal, o juiz poderá considerar que os bens pessoais foram adquiridos com o dinheiro da empresa, então cai por terra a responsabilidade limitada.

Considerações finais

Este artigo descreveu de forma introdutória e resumida informações importantes sobre a relação entre sócios, porém, conforme a introdução, na jornada empreendedora, existem muitas outras áreas do conhecimento a considerar na criação e gestão de uma empresa, assim espera-se que um potencial empreendedor ou sócio – busque pelo menos um mínimo de tais conhecimentos, além do apoio de mentores e advisors, para reduzir os riscos e incertezas que fazem parte de um negócio na prática.


Autor

Nei Grando – diretor executivo da STRATEGIUS, é consultor e palestrante em estratégia, inovação, transformação digital, organizações exponenciais e cidades inteligentes; pesquisador em inteligência artificial; conselheiro de empresas e mentor de startups. Autor do blog neigrando.com – Mestre em ciências pela FEA-USP, graduado em TI pela UEM, com MBA em Administração pela FGV e cursos de extensão em Estratégia e Gestão do Conhecimento (FGV) e Inovação e Redes Sociais (ESPM). Teve duas empresas de software e soluções de TI, onde conduziu o desenvolvimento de portais e plataformas digitais de negócios, internet-banking, home broker, CRM, GED, GC e outros. É o organizador e um dos autores do livro “Empreendedorismo inovador”, e autor em outros três. Como professor, ministrou as disciplinas de “Strategic Thinking” e “Planejamento Estratégico” em curso MBA da FIAP, “Intelligence Driven Decision” e “Fundamentos de Inteligência Artificial” em curso MBA da ESPM e como prof. convidado, no curso “Laboratório de Startups” do CIC-ESPM.

Notas

[1] SHUMPETER (1934)

[2]Veja mais sobre o Startup Genome Report 2011, resultante de pesquisa foi feita com mais de 660 empresas de TI para levantar características de Startups de sucesso, em:

[3] Segundo a Wikipidia: O perfeccionismo é um distúrbio neurótico no qual a pessoa tem um sentimento constante de insatisfação com seu desempenho e dúvidas sobre a qualidade de seu trabalho, o que leva o indivíduo a escrupulosidade, verificações de pormenores, obstinação, prudência e rigidez excessivas prejudicando a sua pontualidade e eficiência.

[4] Esse acordo é similar ao Acordo de Acionistas utilizados pelas sociedades anônimas (S.A.). IBGC (2019), chama este documento de Acordo de Fundadores na fase pré-operacional e Acordo de Sócios após a empresa ser formalizada e operacional.

[5] Orientações para Elaboração de Contrato Social: http://www.dnrc.gov.br/Servicos_dnrc/Orientacoes_e_modelos/elaboracao_contrato.htm

Modelo de Contrato Social: http://www.dnrc.gov.br/Servicos_dnrc/Orientacoes_e_modelos/modelo_basico_contrato.htm

Referências

BENNETT, Nathan; LEMOINE, G. James. What a difference a word makes: Understanding threats to performance in a VUCA world. Business Horizons, v. 57, n. 3, p. 311-317, 2014.

BRASIL. Lei 6.404. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. 15 dez. 1976. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6404consol.htm>. Acesso em: 20 abr. 2019.

FDC – Fundação Dom Cabral. Causa da mortalidade das startups brasileiras: como aumentar as chances de sobrevivência no mercado. 2012. Disponível em: < https://www.fdc.org.br/conhecimento/publicacoes/artigo-29767>. Acesso em: 20 abr. 2019.

GERBER, Scott. Nunca procure um emprego! Dispense o chefe e crie o seu próprio negócio sem ir à falência. São Paulo: Évora, cap.6, p.92-103, 2012.

GRANDO Nei. Só ou acompanhado? A escolha de sócios. In: GRANDO, Nei. (ORG). Empreendedorismo inovador: Como criar Startups de Tecnologia no Brasil. São Paulo: Évora, cap.4, p.54-72, 2012. 

IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Governança Corporativa para Startups & Scale-ups. São Paulo: IBGC, 2019.

SCHUMPETER, Joseph A. The theory of economic development: An inquiry into profits, capital, credit, interest, and the business cycle. Transaction publishers, v.55, 1934.

STARTUP COMMONS. “Startup Development Phases”. Disponível em: <http://www.startupcommons.org/startup-development-phases.html&gt;. Acesso em: 20 abr. 2019.

TRIAS DE BES, Fernando. O Livro Negro do Empreendedor: Depois não diga que não foi avisado. Rio de Janeiro: Best Seller, cap.6, p.56-61, 2008.

WELCH, Jack.  Paixão por Vencer. São Paulo: Campus, 2005

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As Bolhas Sociais dentro do Sistema

Redes sociais existem na sociedade antes mesmo da existência da Internet. Elas são grupos ou conjuntos de relacionamentos, onde cada pessoa é um nó da rede que é conectado a outros nós da rede pelo relacionamento que uma pessoa tem com a outra. Normalmente as pessoas participam de redes sociais compostas de colegas do trabalho, “irmãos” da igreja ou amigos de algum clube, pessoas da família e parentes, amigos mais próximos etc. É claro, porém, que algumas pessoas pertencem a mais de um destes grupos, causando assim algumas conexões entre eles.

Mas essas redes foram além, pois agora participamos destas também de forma virtual, a partir de ferramentas ou aplicativos, como Facebook, LinkedIn, Instagram, Twitter, etc. [1] Os fornecedores destes aplicativos “gratuitos” e seus investidores e patrocinadores se utilizam destas redes de pessoas e seus relacionamentos como um canal de mídia, tornando-se o que conhecemos por mídia social, usada segundo os interesses dos proprietários de tais canais e dos anunciantes. Essas mídias sociais e seus algoritmos passaram a nos conhecer e a ter influência significativa sobre nós. Elas mapeiam nossa navegação, os posts com os quais interagimos e como reagimos diante deles (curtir, gostar, reportar), além de observarem as informações de texto, fotos e vídeos que publicamos

É natural que nos relacionemos com pessoas, marcas e canais de mídia que  compartilhem dos mesmos gostos, interesses, ideias e visões de mundo de que a gente. Mesmo antes da existência da web, fazíamos isso em nossos círculos sociais e hábitos de consumo. A diferença é que, com os algoritmos avançados de inteligência artificial e técnicas usadas em jogos, estas “redes sociais” observam com quais pessoas e marcas a gente mais se relaciona e passam a escolher quais conteúdos a gente vê, sem que a gente nem perceba. Enfim, nosso comportamento nesses espaços, somado à capacidade algorítmica desses aplicativos, nos coloca em agrupamentos invisíveis a nós, conhecidos como “bolhas”.

Uma bolha de filtro é constituída relacionando interesses comuns entre as pessoas que pertencem a ela e os interesses do sistema que a criou. O interesse do sistema é exercer influência ainda maior de retenção e de mídia às pessoas que pertencem a estas bolhas. Então, ao longo do uso de tais aplicativos ou ferramentas de mídia social, as pessoas sem se darem conta ficam parcialmente presas a estas bolhas, sofrendo a influência delas sobre si e, querendo ou não, influenciando e reforçando ideias e informações às outras pessoas que estão nas bolhas. [2]

Outro ponto importante a se considerar é que, ainda que existam elementos positivos em agregar pessoas com interesses em comum, ou com semelhanças significativas aos anunciantes que as veem como potenciais consumidores, tais divisões podem intensificar desigualdades e conflitos já presentes na sociedade. Quando as pessoas são, sem ciência disto, segregadas em linhas de pensamento, modos de comportamento, classes sociais ou até mesmo raças e etnias, de modo que recebem apenas um número restrito de informações, conhecimentos e experiências, é bastante possível que se tenham problemas sociais e políticos por consequência.

Fonte: Diagrama de Rede Social. Credito: Daniel Tenerife/Wikipedia

Como saber se estamos em uma bolha social?

Quando vemos opiniões conflitantes em nosso feed de notícias (timeline) isto pode causar desconforto e angústia.  Não ter contato com outras visões de mundo, porém, pode nos levar a percepções distorcidas da realidade.

Imagine que, ao entrar na sua rede social favorita, você se depare com um post de alguém conhecido que o deixa desconfortável. Pode ser um meme zombando de seu candidato político, uma proclamação com a qual você discorda sobre um assunto delicado, como controle de armas, ou mesmo uma foto de alguém vestindo ou fazendo algo que provoque grande zombaria. Diante disso, você por acaso pensa: “vou silenciar as postagens desse sujeito”, “cancelando” seu amigo sem pensar duas vezes? Talvez, a princípio, você até sinta um alívio de poder voltar a ver seu feed de amigos que pensam exatamente como você, com anúncios totalmente direcionados aos seus desejos, mas, sem perceber, você acabou de fortalecer sua bolha de reforço.

Sim, nós contribuímos para a formação das bolhas, somos parcialmente culpados por nossos feeds altamente selecionados, mas como vimos antes a culpa não é toda nossa. Vejamos algumas explicações mais detalhadas de especialistas sobre as responsabilidades das partes envolvidas.

Nós selecionamos nossa própria bolha

Nós temos uma tendência natural de nos cercarmos de pessoas que pensam como nós.

Sentimos pensamentos conflitantes como um desconforto psicológico  considerável. A varredura cerebral revelou, de fato, que a dissonância cognitiva ativa áreas emocionais como a ínsula anterior e o córtex cingulado anterior dorsal ”, diz Don Vaughn, neurocientista do departamento de Psicologia da UCLA. “Visto que preferimos evitar experiências negativas, não é surpresa que as pessoas evitem o desconforto psicológico imediato da dissonância cognitiva simplesmente por não ler ou ouvir opiniões divergentes.”

A autora acrescenta, ainda, que há um gasto de energia envolvida nessa tendência. Essencialmente, o processamento de novos fatos, ideias e perspectivas requer um esforço neural significativo. Em outras palavras, ele força nosso cérebro a reconfigurar sua teia de conexões para entender, avaliar e potencialmente incorporar o novo conhecimento ao qual se está sendo exposto.

Algoritmos de mídia social filtram a realidade

O outro fator, que não deve ser subestimado, é a “bolha” da mídia social, um termo cunhado pelo ativista da internet Eli Pariser. Em sua palestra viral no TED, ele definiu essa “câmara de ressonância” como um “universo pessoal e único de informações em que você vive online. E o que está em sua bolha depende de quem você é e do que você faz. Mas a questão é que você não decide o que entra. E o mais importante, você não vê de fato o que é editado”.

Os gigantes da mídia social, incluindo Google, Facebook e Twitter, usam algoritmos secretos que estão sempre mudando, o que acaba criando essas bolhas que filtram informações.

Os algoritmos são propositalmente complicados para garantir que a pessoa média não os descubra”, diz Lisa Strohman, psicóloga clínica licenciada e fundadora da Digital Citizen Academy, uma organização dedicada a ajudar as pessoas a encontrar o equilíbrio entre suas vidas e a tecnologia moderna . “Sabemos que existem vários métodos em que os anúncios são configurados e exibidos. A maior delas é a coleta de dados que nós, os usuários, fornecemos voluntariamente ou não. Isso permite que os gigantes controlem ou manipulem o preço da publicidade e até mesmo publiquem seus próprios anúncios ou narrativas, se assim desejarem”.

Dica: Se você estiver curioso, este exercício pode lançar  uma luz parcial às suas bolhas de filtro: vá para o feed do Facebook, clique na seta para baixo à direita e vá para Configurações. A partir daí, clique em Anúncios, em seguida, em Suas informações e em suas categorias. Isso revela uma lista de dados que o site tem sobre você para fins de publicidade de terceiros, que vão desde suas inclinações políticas a hobbies, renda familiar e a probabilidade de você se envolver com determinado conteúdo político.

A realidade é que todas as plataformas agora nos alimentam constantemente com conteúdo que se alinha aos nossos próprios interesses, amigos e sistemas de crença. Eles são capazes de pegar o que navegamos ou postarmos e nos enviar de volta nossos próprios pensamentos coletados de outros seguidores de mídia social, como se tivéssemos centenas e milhares de amigos que se sentem da mesma maneira”, diz Strohman.

O problema com as bolhas

Antes de ignorar a noção de bolhas – considere seus perigos potenciais, conforme sugestão de Wendy Rose [3]:

  • Superestimamos a prevalência de nossa perspectiva: “Nosso cérebro constrói um modelo do mundo a partir das interações com nosso meio ambiente. Se todas as nossas interações forem unilaterais, o modelo do nosso cérebro será tendencioso”, diz Vaughn. Seria mais ou menos como se estivéssemos todos assistindo a um filme com o mesmo título, mas com histórias completamente diferentes. Esta é uma suposta razão pela qual muitos republicanos ficaram chateados com os resultados das eleições de 2020 nos EUA, pois superestimaram as chances de vitória de seu candidato.
  • Nossa empatia pelos outros diminui: “Minha pesquisa neurocientífica sobre empatia ressalta o fato de que simples noções de‘ nós ’e‘ eles ’ afetam como nosso cérebro processa a dor de outra pessoa. Quando ‘eles’ estão com dor, simulamos menos sua experiência e mostramos menos empatia”, diz Vaughn. Em última análise, reforçar nossas próprias crenças nos endurece em relação aos outros.
  • Inibe o diálogo autêntico e a mudança verdadeira: “Reforçar nossos sentimentos e pensamentos atuais nos faz sentir melhor”, diz Strohman, “mas, ao fazer isso, também perdemos a capacidade de elevar nossas ideias e colaborar nas principais questões que nossa nação está enfrentando.” Discutir abertamente e, mais importante, ouvir uns aos outros sobre questões polêmicas tem mais chances de promover ideias e soluções que melhoram nosso mundo.

Como contornar bolhas de reforço

Embora exista pouco que possamos fazer para impactar os algoritmos existentes, podemos dar passos em nossas vidas pessoais para estourar nossa bolha de reforço, ou pelo menos permitir que outros entrem nelas, conforme sugestões de Wendy Rose [3].

  • Ajuste os filtros que você pode controlar: Gerenciar nossos filtros, especificamente em relação às fontes de notícias, é extremamente importante. “Encontrar fontes menos tendenciosas ou se concentrar em ouvir dois feeds separados de forma equilibrada pode ser muito útil para obter uma perspectiva importante”, diz Strohman. Reconsidere tudo que te alimenta de informação, como os seus livros, podcasts, estações de rádio, revistas e jornais também.
  • Evite excluir aqueles com os quais você discorda: mesmo que você não esteja se envolvendo ativamente com esses conhecidos, expor-se a uma variedade de pensamentos o impede de superestimar a prevalência de sua própria perspectiva.
  • Envolva-se com alguém que tenha pontos de vista diferentes: “Procure alguém que você possa respeitar e que seja informado, que tenha uma visão oposta à sua posição”, diz Strohman. “Isso pode ajudar a descobrir e compreender nosso preconceito oculto em nossas origens.
  • Evite a alienação participando de debates, fóruns e comícios: seja um fórum aberto para sua associação de bairro ou um comício político, participar de eventos locais onde você pode interagir com as pessoas em tempo real abre a porta para um diálogo autêntico e novas perspectivas. Vá com a intenção de ouvir, não de discutir.

E quanto aos silos organizacionais, seriam eles como bolhas sociais?

Ao pensarmos e refletirmos sobre bolhas sociais, isso pode nos remeter a seguinte questão: Os silos organizacionais também não seriam, do ponto de vista de pessoas, cultura e relacionamentos, algo parecido com tais bolhas sociais?

O ritmo de mudança atual exige equipes mais colaborativas e inovadoras. Nesse sentido, a empresa deve buscar superar os silos e apoiar a interação multifuncional eficaz entre as equipes.

Quando as equipes saem de seus silos, a organização tem uma chance melhor de sucesso a longo prazo.

Segue abaixo algumas estratégias do artigo de Ian Cornett [4] que podem ajudar a quebrar silos e promover uma colaboração multifuncional em toda a organização:

Comunique uma visão unificada

Frequentemente, os silos organizacionais se formam porque as metas individuais ou departamentais se tornaram extremamente prioritárias e muito importantes, fazendo com que os funcionários percam de vista os objetivos mais amplos da empresa. Uma visão unificada, que é amplamente comunicada entre os funcionários, ajuda os indivíduos a compreenderem que as metas individuais e de equipe são secundárias à visão organizacional.

Para organizações que se acostumaram a operar em silos, a visão precisará ser comunicada com frequência e em diferentes meios para que permaneça como prioridade. Quando as pessoas têm uma visão geral, podem começar a entender seu lugar único na organização, bem como o de outras pessoas. Com o tempo, o foco em si mesmo e na equipe se expandirá para incluir outros indivíduos e equipes que também fazem parte da visão da empresa.

Crie responsabilidades compartilhadas

Uma vez que uma visão unificadora tenha sido estabelecida e comunicada, ela precisa se traduzir nos comportamentos cotidianos de equipes e indivíduos para se estabelecer. As equipes podem se beneficiar por terem metas compartilhadas que as unem, em vez de dividi-las. Por exemplo, uma organização pode alinhar as metas do departamento de TI com as de outros departamentos para garantir o uso mais eficiente dos sistemas internos de TI. Para quebrar ainda mais os silos organizacionais, também pode ser útil ter duas ou mais equipes trabalhando juntas em uma força-tarefa que termina com uma apresentação conjunta para a alta administração.

Reúna as equipes

Romper silos organizacionais e aumentar a colaboração entre equipes não acontece por si só, mas será mais provável quando os indivíduos tiverem oportunidades de interagir e trabalhar juntos. Reuniões conjuntas, grupos de foco e sessões de bate-papo podem fornecer aos funcionários a oportunidade de conhecer pessoas de outras equipes, quem faz o quê e como eles podem ajudar uns aos outros para atingir os objetivos da empresa. Outras atividades que reúnem equipes incluem a combinação de equipes semelhantes sob co-chefes, ou co-localização de equipes que podem se beneficiar da proximidade física, como no caso de empresas que mantêm equipes de vendas e marketing juntas. Organizar eventos corporativos também pode promover a colaboração, construir confiança e encorajar relacionamentos entre equipes.

Envolva a liderança

Pessoas em equipes diferentes provavelmente não colaborarão e permanecerão em silos, a menos que vejam suas lideranças modelando comportamento colaborativo. Os líderes da empresa precisam dar o exemplo para demonstrar que esperam um trabalho multi-funcional em equipe e o compartilhamento de informações entre seus funcionários. Os líderes podem apoiar uma maior colaboração das seguintes maneiras:

  • Fale sobre metas compartilhadas entre equipes
  • Designe um ou dois membros da equipe para manter outra equipe informada sobre um projeto importante
  • Comunique-se regularmente e passe tempo com líderes de outras equipes
  • Reconheça e recompense os indivíduos que demonstram colaboração com outras equipes
  • Incorpore ferramentas de colaboração

Na era digital, há uma variedade de ferramentas de colaboração no local de trabalho que podem reunir equipes na nuvem, tornando mais fácil o compartilhamento de ideias e informações.

As ferramentas de colaboração digital podem ser particularmente úteis na unificação de equipes e indivíduos remotos. Alguns exemplos incluem:

  • Plataformas de gerenciamento de projetos com recursos de chat e quadro branco virtual
  • Documentos compartilhados que permitem que várias equipes acessem e colaborem em apresentações, propostas e planos de projeto
  • Ferramentas de gerenciamento de dados que incorporam dados de outras plataformas – por exemplo, um CRM que se integra aos painéis da empresa usados por várias equipes

Mude mentalidades e comportamentos com treinamento

Uma ótima maneira de ajudar os funcionários a se libertar dos silos é treiná-los para se envolverem em comportamentos que apoiem mais o trabalho em equipe e colaboração. Com a ajuda do treinamento de responsabilidade, comunicação e liderança, para citar alguns, os funcionários podem aprender mais sobre os perigos dos silos, ver os benefícios da colaboração e praticar técnicas úteis para quebrar os silos no trabalho.

Silos organizacionais impedem a inovação e o crescimento. Eles também limitam o sucesso dos indivíduos, impedindo-os de perceber os benefícios positivos do trabalho em equipe e da colaboração. Ao usar estratégias que incentivam os indivíduos a se considerarem parte de uma equipe organizacional mais ampla, uma colaboração mais multifuncional pode se tornar uma realidade.

Considerações finais sobre como as redes sociais nos afetam

“Devemos sair de nossa tendência de teorizar sobre como a mídia social nos afeta e desenvolver uma compreensão científica rigorosa de como funciona.” – Sinan Aral, MIT Sloan professor

Para evitar os excessos das influência de tais redes em nossas vidas, precisamos, em primeiro lugar, buscar conhecimentos que tragam uma maior consciência sobre como ela opera. Em seguida, está o uso moderado e equilibrado dessas ferramentas, procurando manter contato não apenas com pessoas que pensam como você, mas também com ideias divergentes. Na sequência  estão a postura e o comportamento nas redes, procurando atuar de forma construtiva, incentivando e ajudando as pessoas, evitando críticas desnecessárias, tendo o cuidado de ler e analisar as informações recebidas antes de apoiá-las ou repassá-las, principalmente se forem falsas, maldosas ou mentirosas. Enfim, contribuindo sempre que possível de forma positiva e proativa durante a utilização de tais ferramentas.

Autor

Nei Grando – diretor executivo da STRATEGIUS, é consultor e palestrante em estratégia, inovação, transformação digital, organizações exponenciais e cidades inteligentes; pesquisador em inteligência artificial; conselheiro de empresas e mentor de startups. Autor do blog neigrando.com – Mestre em ciências pela FEA-USP, graduado em TI pela UEM, com MBA em Administração pela FGV e cursos de extensão em Estratégia e Gestão do Conhecimento (FGV) e Inovação e Redes Sociais (ESPM). Teve duas empresas de software e soluções de TI, onde conduziu o desenvolvimento de portais e plataformas digitais de negócios, internet-banking, home broker, CRM, GED, GC e outros. É o organizador e um dos autores do livro “Empreendedorismo inovador”, e autor em outros três. Como professor, ministrou as disciplinas de “Strategic Thinking” e “Planejamento Estratégico” em curso MBA da FIAP, “Intelligence Driven Decision“ e atualmente “Fundamentos de Inteligência Artificial” em curso MBA da ESPM e como prof. convidado, no curso “Laboratório de Startups” do CIC-ESPM.

Referências:

[1] Aral , Sinan Kayhan. The promise and peril of The Hype Machine, MIT Management Sloan School.

[2] Site Oficial NetFlix, Documentário. O Dilema das Redes.

[3] Gould, Wendy Rose. Are you in a social media bubble? Here’s how to tell.

[4] Cornett, Ian.  6 Strategies for Breaking Down Silos in Your Organization.